Sobrevivendo a um Ataque de Tubarão e Voltando Mais Forte do que Antes
Experimentar o tipo de perda que Mike Coots teve pode deixar qualquer pessoa desabilitada pelo resto da vida. Ao invés de se afundar na auto-piedade, Mike transformou o pesadelo de qualquer surfista em um impulso para mudar a sua vida.
11/Fev/2014 - Reid Levin - the inertia - Kauai Costa Norte - Hawaii - Estados UnidosNa verdade, depois de ter a sua perna direita arrancada por um tubarão-tigre em seu pico local em Kauai, ele virou a situação 180 graus. Em vez de temer, ressentindo-se e evitar tubarões, Coots faz lobby para a sua conservação, mergulha com eles e continua a surfar no mesmo local em que ele foi atacado com a tenra idade de 18 anos.
Além disso, ele ajuda a uma amiga de toda a vida e "irmã" Bethany Hamilton, com sua fundação e fornece conselhos para amputados e vítimas de ataques de tubarão. Ele também voltou a surfar depois de sua perna ter sido amputada e agora faz tow-in em ondas enormes, enquanto usa uma prótese.
Dizer que Mike fez o melhor de uma situação ruim é um eufemismo, no mínimo. Ele considera o acidente uma bênção e está pronto para fazer o que puder para proteger os animais que quase lhe tiraram a vida.
Veja o impressionante portfólio de Mike no site The Inertia
Você pode contar como foi o ataque de tubarão?
Eu estava nesta equipe bodyboarding e logo após a escola, estávamos todos juntos. Eu tinha 18 anos na época e foi no início de outubro. Fomos surfar no lado oeste de Kauai. Há uma base militar lá e um bom pico de surf que nós todos fomos.
Lembro-me que todos fomos para a praia. Foi no início da manhã e todos nós remamos para fora. Eu estava no meu bodyboard e as ondas tinham cerca de um metrão. Uma série boa veio e todos os meus amigos pegaram ondas. Acho que foi uma série de cinco ondas. Pouco tempo depois, era eu e um outro cara lá fora era. Quando a última onda veio, eu me lembro de olhar para ele e nós olhamos um para o outro perguntando quem iria pegar a onda, e eu comecei a remar e logo que eu fiz um movimento, o tubarão se aproximou e me agarrou. Eu não vi ele vindo de longe, nem nada, e não era uma barbatana assustadora vindo em minha direção. Foi um ataque surpresa. Tipo como um submarino, mas vertical. Ele travou na minha perna e começou a me balançar para frente e para trás, tipo como um pitbull faria com uma boneca.
Durante o movimento de vaivém, eu lembro de me sentir muita pressão nas minhas pernas, como um cara grande estivesse sentado em cima de mim. Eu não senti nenhuma dor nem nada. Depois que ele me balançou para frente e para trás algumas vezes, eu, com a minha mão esquerda, dei um soco em seu focinho muito forte. Ele me soltou imediatamente e voltou para debaixo d'água. Voltei para a minha prancha e eu olhei para o meu dedo indicador e estava todo ensanguentado e eu podia ver o osso e outras coisas de fora. Parecia uma batata fatiada. Eu fiquei meio que apavorado. Eu estava tipo, "Oh cara, eu estou ferido." Depois que eu olhei para o meu dedo, eu olhei para o cara que eu estava disputando a onda comigo, e seu rosto estava completamente branco. Eu gritei, "tubarão! Vá para a praia" e ele começou a remar e eu remei atrás dele.
Quando eu estava remando, minha perna direita começou a fazer este balanço, como um espasmo total. Lembro-me de pensar: "É isso. O tubarão me pegou de novo e eu estou frito." Eu olhei por cima do meu ombro e não vi o tubarão, mas eu vi a minha perna completamente cortada. Eu não tinha idéia que eu estava realmente machucado, mas a minha perna tinha desaparecido. Você não poderia ter feito uma melhor amputação com um bisturi. Foi perfeitamente cortada. Eu lembro de ter visto sangue jorrar para fora no meio cada vez que meu coração batia.
Nesse ponto, uma outra onda veio e eu a peguei e a surfei até a areia e eu tentei levantar-me na praia. Sabe, você está acostumado a ficar em pé em dois pés toda a sua vida e eu me lembro de cair na areia com sangue por toda parte. Meu amigo Kyle viu isso e correu para perto, me arrastou um pouco mais para o alto, pegou a cordinha da minha prancha e fez um torniquete instantaneamente e começou a fazer uma oração. Fechei os olhos e me lembro de orar com ele e, assim que ele terminou a oração, eu abri meus olhos e então havia esta picape ali perto. Esse cara, Keith, tinha visto de longe. Ele tinha me visto na areia e me jogou na caçamba da picape e partimos para o hospital.
Lembro-me de entrar e sair do estado de choque, realmente quente e frio, entrando e saindo da consciência. Assim que chegamos ao hospital, estes cirurgiões começaram a correr até a picape e apaguei. Acordei no dia seguinte e eu estava no nosso hospital principal, após a cirurgia e tudo mais. Minha família e amigos estavam todos lá.
Depois disso, passei cerca de um mês fora da água por causa dos pontos. Eu acho que há um alto risco de infecções, então eu tive que esperar até que tudo se curasse e, logo em seguida, eu estava de volta na água pouco mais de um mês depois.
O que passou pela sua cabeça quando o tubarão estava o balançando para trás e para a frente?
Não foi uma experiência fora do corpo ou coisa parecida. Eu estava olhando diretamente para o tubarão. Durante toda a sua vida no oceano, você está basicamente se preparando para esse momento. Eu sabia que era um tubarão me atacando. O soco ( no focinho do tubarão ) foi totalmente instinto de luta ou instinto de fuga.
No Havaí, temos centopéias. Quando você vê uma, você meio que arregala os olhos. Lembro-me de ter esse sentimento exato. O sentimento "fique longe de mim" onde você sente aquela sensação arrepiante. Eu sabia que eu tinha que ficar longe da situação. Tudo o que eu tinha que fazer - soco, chute, qualquer coisa que seja. E deu certo. Assim que eu bati no tubarão, ele me largou e foi embora.
Você se lembra de ser levado para o hospital?
Sim, na verdade, nós deixamos a tampa traseira da picape abaixada e nos movemos tão rápido que ninguém pensou em entrar lá comigo. Eu estava deitado sozinho e o cara tinha o seu quiver de pranchas lá ao meu lado, e eu me lembro das pranchas estarem dentro de capas toalha. Eu estava brincando com o pano das capas para manter minha mente fora da lesão, não tentar olhar para a minha perna.
Eu também estava olhando para fora pela abertura da tampa traseira e estávamos nos movendo muito rápido, os carros que passavam e tudo mais. Em um ponto, passamos por uma menina e sua mãe e a porta do bagageiro é baixa e eu estava todo ensanguentado, toda a traseira coberta de sangue. Lembro-me de olhar para a mãe e para a filha, e elas sairam da estrada, parecendo muito perturbadas. Lembro-me de pensar: "Isso não é bom." Você sabe quando você pode meio que julgar a sua lesão na expressão de outros? Foi um daqueles momentos em que eu sabia que não era bom, olhando para as reações das pessoas ao me ver.
Nas cinco semanas de recuperação, o que aconteceu? Isso foi quando você começou na fotografia?
Totalmente. Eu estava na equipe de surf e fizemos pequenos projetos de vídeo aqui e ali, e meu treinador tinha algumas câmeras fotográficas. O que aconteceu foi que eu comecei a usar suas câmeras e eu começei por filmar meus amigos Kamalei Alexander e Evan Valiere e esses caras.
O que realmente me deixou amarradão nisso foi quando esse cara John Russell que veio me fotografar para uma revista logo após o ataque. Ele voltou para Kauai, alguns meses depois de fazer uma sessão da revista Sports Illustrated, e ele não conhecia ninguém na ilha, exceto por mim. Ele queria saber se eu queria ajudá-lo na filmagem, e eu disse "Claro, por que não?" Estar na foto com ele e vê-lo trabalhar me fez acreditar que era realmente uma grande profissão. Eu pensei que gostaria de fazer isso pra viver. E foi ao mesmo tempo em que eu estava tentando descobrir o que eu ia fazer agora que minha carreira como bodyboarder tinha acabado.
Eu amei fotografar com John e eu falei com a minha mãe que procurou na internet para ver se havia alguma faculdade que ensinasse fotografia. Nós encontramos a Brooks Institute, em Santa Barbara, e eu me inscrevi e fui aceito. Logo à noite, ao que parece, eu estava aprendendo fotografia na faculdade.
No meio do programa, tivemos uma aula de marketing e a professora falou: "Aqui estão peças promocionais de fotógrafos de todo o país", e ela me deu um folder promocional deste fotógrafo e era John Russell. Naquele momento, o ciclo se fechou. Assim que a classe acabou, liguei para ele e disse-lhe que estava na faculdade por causa dele e ele disse: "Na verdade, eu estou em Santa Barbara agora. Vamos almoçar." A partir daí, ele começou a me ajudar com trabalhos maiores para clientes maiores. Foi tudo como uma bola de neve a partir daí. Foi uma experiência incrível.
Conte-me sobre o seu envolvimento com a conservação dos tubarões.
Alguns anos atrás, eu recebi um telefonema do Pew Environment Group. Eles perguntaram se eu sabia sobre "finning" de tubarões. Eu não tinha idéia do que era, ou qualquer dos fatos e questões sobre isso. Aprendi ao assistir o filme "Shark Water" que cerca de 70 milhões de tubarões por ano são mortos por suas barbatanas, e eles me ligaram de novo para perguntar sobre isso. Eles começaram a me mandar mais informações e me colocaram em contato com cientistas que explicaram a ciência por trás disso.
Quanto mais eu aprendia, foi uma coincidência que eu estava em uma posição valiosa como uma vítima de ataque de tubarão a falar em defesa dos tubarões. Eu acredito que eles estão no oceano por uma razão - eles sobreviveram a eras glaciais, extinção, tudo isso. Eles são a cola que mantém a diversidade marinha junta, alguns cientistas diriam, embora eles estejam sendo mortos em um ritmo alarmante e muitos estão à beira da extinção.
O grande tubarão branco é uma espécie ameaçada e Colin Barnett está quebrando 21 leis e políticas internacionais e leis na Austrália. Eu não acho que colocar uma bala na cabeça deles é ensinar a lição correta para o mundo. Em vez disso, talvez marcá-lo e aprender mais sobre isso? Aprenda a conviver com isso. Eu só acho que é uma reação totalmente instintiva e é o caminho errado.
Como é que você voltou para a água depois do ataque de tubarão? Havia um obstáculo mental para superar ou foi a transição perfeita?
Não foi difícil. Eu diria que realmente tem a ver com crescer na água, no Havaí. Se eu tivesse nascido longe do litoral e tivesse colocado meu dedo do pé na água e um tubarão saltasse e me atacasse, e essa tivesse sido a minha única interação com o oceano, seria uma coisa totalmente diferente. Mas como eu passei tanto tempo mergulhando quando era criança, e mergulhando e surfando de bodyboard, foi com voltar ao território. Se a água é salgada, é a casa do tubarão. A parte mais difícil de todo o calvário estava sendo ficar fora da água. Não era tubarões ou qualquer coisa assim. Era não estar sendo capaz de surfar na temporada de inverno.
Houve algum estresse pós-traumático?
Não. Eu tenho sorte. Eu nunca tive um pesadelo. Não houveram espasmos, nada disso. Nada que alguém fala e eu começar a ter flashbacks. Houve basicamente zero efeito psicológico em mim. Houve, no entanto, algumas sessões de surf, depois do ataque, quando eu tive alguns sustos ao ver grandes turbulências na água. Não houve flashbacks mas eu vi o sangue fluindo.
Recentemente, eu fui mergulhar com tubarões e é muito legal interagir debaixo d'água com eles. É uma coisa muito diferente. Além disso, a chance de alguém ser mordido duas vezes por um tubarão - quero dizer, essas chances são absolutamente astronômicas. Se eu fosse, talvez eu seria capaz de escrever um bom livro ou algo assim. Eu não estou muito preocupado com isso.
Nenhum fantasma ou dores fantasmas?
Houveram algumas dores fantasmas, mas isso é tudo físico. Nenhum material psicológico. Elas foram embora depois de algum tempo.
Está aliviado depois de receber a prótese e se acostumar a usá-la?
Não, vai aliviando com o tempo. Sabe, talvez seja uma coisa mental. Alguns cientistas e médicos descobriram uma maneira para as vítimas da guerra, depois de ter a sua perna arrancada e eles estão colocando na cama do hospital , eles colocaram um espelho onde a sua perna deveria estar, o que engana o corpo em pensar que a perna ainda está lá, vendo o reflexo da outra. Tem ajudado muito com a dor fantasma. Acontece com todo mundo que perde um membro, a dor fantasma.
Você e Bethany Hamilton são ambos sobreviventes de ataques de tubarões de Kauai que perderam membros. Existem laços especiais entre vocês? Como isso se manifesta?
Absolutamente. Sem dúvida. Há uma ligação definitiva. Ela é como minha irmã. Temos este tipo de vínculo tácito de que estamos juntos neste clube que mais ninguém faz parte. É óbvio que sempre que estivermos surfando ou nos divertindo. E outras pessoas se chegarem. É como, "Olha, há duas vítimas de ataque de tubarão lado a lado. Um está faltando um braço, o outro está faltando uma perna." No entanto, eu a conheço muito antes do ataque também, e nós somos amigos próximos de família. Quando ela estava no hospital depois da cirurgia, ela abriu os olhos eu estava lá. A primeira pessoa a vê-la quando ela saiu da cirurgia. Então nós temos esse momento especial também.
Como foi o retorno a ser ativo na água com uma prótese?
Eu era um bodyboarder até depois do ataque. Quando eu fui para Santa Barbara para a faculdade, onde as ondas não são boas para praticar o bodyboard, foi quando eu aprendi a surfar de prancha.
Um dia, eu peguei uma prancha e fui surfar na praia Leadbetter e eu me lembro de andar até a beira da água. Comecei a entrar na água para testar se essa coisa [ prótese ] ia desmoronar. Fiquei com água até os joelhos e ela estava segurando. Um pouco mais pra dentro da água e eu fui capaz de deitar em cima da prancha e remar. Pareciam águas desconhecidas, porque eles dizem para não levá-la para dentro da água, que ela vai quebrar e o seguro não vai cobrir isso se acontecer alguma coisa. Eles realmente dizem para não fazer o que eu faço com ela. Então, eu saí lá para fora, e eu tentei ficar de pé e foi como, vamos dar um passo de cada vez. Literalmente. E a coisa não estava se despedaçando. Não estava se desintegrando diante dos meus olhos e eu voltei e a lavei e ela estava bem.
A próxima prótese foi feita para mim, eu pedi para eles construirem uma área mais estreita na junção, para que a cordinha não deslizasse para baixo até o tornozelo e o puxasse. Eu percebi que se eu pudesse deixar a cordinha mais alta, quase como fazem os longboarders, haveria menos puxões. A partir daí, eu descobri como fazer uma perneira para realmente segurar em ondas maiores, e quais tornozelos funcionam melhor. Eu sempre pensei que seria melhor ter um tornozelo realmente flexível, porque eu seria capaz de descer na base da onda e pegar o tubo. Se não fosse flexível, eu me curvaria e ficaria na ponta dos dedos, se isso faz sentido. Infelizmente, com o tornozelo muito flexível, eu não tinha força na cavada, então eu aprendi a linha tênue entre o flexível e o duro. Um pedaço de borracha e metal, infelizmente, não sabe quando flexionar e não flexionar, então eu aprendi qual é a melhor rigidez. Eu também aprendi tudo sobre o ângulo tanto para dentro e para fora que o pé faz no meu posicionamento na prancha. Meu pé protético fica um pouco para a direita, de forma que eu sou capaz de compensar.
O surfe de tow-in realmente parece ajudar a descobrir isso, porque você pode realmente sentir a mecânica da prancha, enquanto que, por vezes, se você estiver surfando em um beach break, tudo está acontecendo tão rápido que você realmente não tem tempo para analisar as coisas. Se você estiver sendo puxado, você pode ter uma idéia do melhor ponto.
Assim, a prótese é mais fácil de manejar quando você está fazendo tow-in?
Sim, mas de maneiras que é tipo a mesma. Você apenas tenta estar no melhor ponto onde você obtenha o máximo de resposta. Com a minha prótese, posso pisar em um centavo na estrada e sentir que tem um centavo sob o meu pé. Então, eu posso realmente sentir o deck com minha perna falsa e sei onde estou no deck sem olhar para ele, assim eu posso mudar a posição dessa maneira. Seu cérebro, depois de um tempo, começa a ser capaz de descobrir isso.
Você parece ter conquistado o conceito de medo. Como você lida com isso?
Tudo volta a crescer nesta ilha rude. Sabe, crescer aqui com Andy [ Irons ] e esses caras, você vê as coisas mais loucas acontecerem. Você aprende que a vida não é para ser vivida com segurança. Essa é a nossa educação. Quanto mais radical mais você se sente vivo, a vida é melhor. Você pode querer apenas sentar-se em casa no sofá, mas você realmente vive a vida dessa forma?
O que vem depois para Mike Coots na fotografia, no surf e na conservação?
Bethany e eu temos uma fundação (Amigos de Bethany) onde nós ajudamos um monte de crianças e amputados com deficiência. Eu realmente gostaria de começar a trabalhar com impressoras 3D. Eu sei que elas estão começando a imprimir em fibra de carbono e fazer peças protéticas para as pessoas que delas necessitam. Por exemplo, um parafuso que quebra em sua prótese iria custar centenas de dólares, mas literalmente tostões para imprimir. O sistema médico americano é tão corrupto e quebrado que um monte de pessoas não podem pagar as coisas que eles deveriam ser capazes de ter. Se você é capaz de imprimir essas peças de forma muito barata, seria incrível ter estas impressoras em todo o país e ajudar as pessoas em necessidade. Isso é um grande objetivo meu.
A coisa da conservação de tubarões, também com todos os ataques que tivemos em Maui. Eu realmente espero que não haja mais mortes, porque tenho a sensação de que nosso governo estadual do Havaí pode começar a fazer um tipo similar de programa de abate, porque o turismo pesa muito aqui. Se isso vier a acontecer, eu obviamente quero ser o primeiro a parar tudo isso.
A coisa da fotografia é maravilhosa, ser capaz de documentar e fotografar, mas não é o meu objetivo. Isso paga as contas e é muito agradável, mas eu realmente encontro a minha paixão em ajudar as crianças, como esta manhã com Bethany. Isso é realmente o que eu espero que o futuro traga.
Reportagem traduzida do original do site The Inertia